quinta-feira, 22 de outubro de 2015

XLIX

- Vamos sair?
- Sim, está pensando em ir aonde?
- Podia ser como da última vez em que nos encontramos, quando visitamos outra galáxia juntos.

Imácula

Você me pôs as palavras de volta na boca
Você ofertou-as na minha mão
Elas nasciam enquanto caía a roupa
E floriam enquanto a cama era o chão

Você me inspirou uma canção.

Me inalou, me respirou
Mas eu já estava expirada
Nua, de costas, calada
Perseguindo alguns pensamentos fixos.
Com a boca de uma santa canônica
Com excesso de peso pro lixo.

Às vezes me pego puta, viciada, visceral
E quando subo essa escada há a queda fatal
De me apaixonar de novo pela poesia
Vazia, da noite, de tudo aquilo que esconde o dia
E daquela imácula que eu me escondia.

Enquanto você me perguntava, à mim mesma eu respondia:
Eu quero mistério, quero tudo aquilo que está oculto
Eu quero o seu corpo para me ter de novo viva
Eu quero morder a parte lasciva
Que mora entre a sombra e o vulto.


19/07/15

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Oceano

O senhor do tempo girando os anéis de Saturno
E o meu olhar noturno esculpe a borda da janela
Uma vela se acende pr'aquela que o sono vela
Uma tela pintada no sonho de quem tem o sono solista
Um quadro composto pela luz do poste
Uma mesa velando o sono de um telefone indócil

A cidade me apavora e come as minhas entranhas
São de estanho e cobre os fios que nos separam
Minha memória é de fragmentos de ausências
Um jogo de sorte, corpo, chão, luzes que piscam
Sinto seu cheiro quando ele se mistura ao frêmito da sua mecha de cabelo
Tão longe do que o olho alcança, porém certa de que vigora
Esqueci da hora, senhora dos dias
Perdi a parte em que se ensaia a anestesia
Sou cria forte de toda matéria densa
Espessa e de forma aereamente intensa
Enquanto as constelações se abstêm
De tanta abstração sensível

Nunca existiram olhos tão verdes melados de cana brava
Roxa como os abismos em que me projetava
Por amar o dourado da tua penugem se aprumando ao Sol
Da aurora recém tecida

Sabendo que o conto enebria e finda
E mesmo assim devota à realidade do universo que orbita uma cama
Ao titubear na corda bamba de um violão
Que tange o que o silêncio entoa intuitivo
Aquilo que resiste vivo à significação humana

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

XLVII

um mar revolto adolescente causado pela obviedade da palavra.
peculiarmente uma árvore regada à água salgada:

morava em seu peito uma bela flor de lágrima.

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

XLV

E as roupas deitadas em natureza morta
No oceano do balde d'água.

"Navegar é preciso.
Viver não é preciso."

03/09/15

Inerte

Na memória do seu rosto
Me jogo no anteposto
Como se sentisse o gosto
Daquilo que me completa

O milagre que disso emana
Ama. Chama e clama a sua presença

Nessa dança de opostos
Ficam rastros, ficam ossos
Mal colocados, sentados na cadeira
Cada gota que escorre da janela
Também é uma vela
Acesa na candeia

E na cadência do absurdo
Me faço em sussurros para te ouvir
Temos as luzes da cidade
Que se juntam às metades
Só para dividir

No meu peito, seu leito
Morada das noites em que sua voz pulsa como sangue quente
Me recordo do futuro
Como o que se faz maduro
Daquilo que existe ausente.

03/09/15